domingo, 11 de outubro de 2020

Como se não fosse o mar

 

Hoje o mar de São Luís amanheceu diferente. Não era o mesmo mar que conheci desde quando aqui cheguei para ficar, ainda criança. Não eram as mesmas ondas, as mesmas águas. Era outro o mar, como se aquele velho mar desbotado pelo tempo – ou pelos meus olhos descorados de tanto mirá-lo – houvesse enfim partido para outra costa. 

 

Vim de onde não havia mar. De dentro do Maranhão, meu mar eram dois rios, correntezas que ainda hoje atravessam o imaginário de menino. Só conheci o mar verdadeiro aos 12 anos e logo cedo aprendi a reverenciá-lo. A ilha que passei a habitar me deu de presente esse fascínio pelos mistérios de um oceano particular. O mar de São Luís passou a ser o meu lugar. 

 

Vindo de onde não havia mar, natural seria que eu não me envolvesse tanto, que me contentasse com qualquer mar. Mas um mar puxa outro. E vi que outros mares não eram como o mar de São Luís. E nunca vão ser, felizmente! Mas comecei a achar, ingenuamente, que havia um quê de ingratidão no mar que banhava as nossas praias. 

 

Mares exuberantes, desses que saem nas fotos de revista, enfeitavam praias de outras cidades brasileiras, coloriam litorais de outros países. O Nordeste sempre figurou na lista das mais belas praias do Brasil. Mas não a Ponta d’Areia, o Calhau, o Olho d’Água, o Araçagi. E nós aprendemos a cultuar a ideia de que temos praias feias, porque “a cor da água não ajuda”, como dizem alguns turistas, relativizando teorias sobre estética. 

 

Mas hoje o mar de São Luís amanheceu diferente. A cor barrenta da água, como se fora um rio amazônico, desapareceu com a impetuosidade do sol de outubro e deu lugar a um verde quase esmeralda. Difícil não notar a diferença. Desde o ano passado, um verde tímido vem ensaiando avançar sobre o Golfão Maranhense. E hoje esse verde altivo deu às nossas praias a beleza que nunca enxergamos.  

 

As praias, no entanto, continuam impróprias para o banho. E bares e restaurantes da orla ainda não contam com estrutura adequada. Mas o nosso mar já tem o verde. E algo mais que outras cidades litorâneas não têm: a Ilha do Medo, a Ilha do Cajual, o Boqueirão, Alcântara, o Cais da Sagração, o nosso pescado, os nossos catamarãs, as bianas, os nossos mestres artesãos navais...  

 

Talvez não seja ainda um verde definitivo, como no mar das Caraíbas. Talvez sejam as algas. Talvez sejam as águas dos rios que aqui desaguam. Talvez seja a falta de chuva. Talvez. Mas o mar de São Luís já não é mais o mesmo, depois de hoje. Porque até a brisa que sopra da baía de São Marcos agora ganhou uma nova cor.

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