sábado, 8 de setembro de 2012

Poeta de um breve memorial


Em maio de 1977, São Luís comemorou os 50 anos de vida do poeta Bandeira Tribuzi (nascido a 2 de fevereiro de 1927) com uma festa que se estendeu por três dias, cujo ponto alto foi o lançamento do livro “Breve memorial do longo tempo”, em noite de autógrafos no Teatro Arthur Azevedo. Com a presença de familiares, amigos e muitos admiradores, o evento acabou se transformando na última homenagem em vida ao poeta que tão profundamente cantou São Luís, e a ela dedicou a “Louvação” transformada em hino oficial. A programação da homenagem foi coordenada por Arlete Nogueira da Cruz. Em decorrência de um fulminante infarto, Tribuzi morreria no dia 8 de setembro do mesmo ano, data de aniversário de fundação da cidade.

O economista, jornalista, professor, compositor, ensaísta e poeta, filho do comerciante português Joaquim Pinheiro Ferreira Gomes e da maranhense Amélia Tribuzi Pinheiro Gomes, deixou a cidade de luto. Foram pouco mais de 18 mil dias e noites a “tontear os olhos de sol tropical e a salgar seu tempero humano no mar que invade a ilha”. O “Breve memorial do longo tempo” era, como disse Tribuzi, a taça imponderável de testemunho e solidariedade, um convite à meditação, para “amanhecer a existência”.

José Tribuzi Pinheiro Gomes, o Bandeira Tribuzi dos saraus na Movelaria Guanabara, da sandália no pé, dos livros de poesia (“Alguma existência”, “Rosa da esperança”, “Pele e osso” etc.), dos ensaios literários, dos apontamentos econômicos e dos textos jornalísticos, e um dos fundadores do jornal “O Estado do Maranhão”, estudou em Portugal e foi seminarista franciscano antes de se entregar de vez às letras na capital maranhense, no final de 1946, quando retornou da Europa. Deixou também farto material literário publicado postumamente. Classificado de agitador e subversivo pelos militares, Bandeira Tribuzi foi demitido do serviço público e chegou a ser preso pela ditadura.

Em 1986, em homenagem ao poeta, o então governador Luiz Rocha inaugurou o Memorial Bandeira Tribuzi, numa área de oito mil metros quadrados na península da Ponta d’Areia. Com projeto de traços modernos assinado pelo arquiteto Manoel Carlos Carvalho, a obra foi entregue com pompa à comunidade, e passaria a abrigar todo o acervo de fotografias, desenhos, charges, livros, originais de poesia, textos então inéditos e partituras de Tribuzi, documentos em sua maioria cedidos pela família do poeta e por amigos.

Não obstante a imponência do prédio e a importância da homenagem, a escolha equivocada do local levou o memorial a se transformar, em pouquíssimo tempo, num elefante branco. Sem um projeto adequado de funcionamento e sem a mínima estrutura para preservação do acervo, um ano depois de inaugurado o monumento a Tribuzi já estava fechado para reforma. Em 10 de dezembro de 1988 foi reaberto em evento oficial do governo do estado, e logo depois abandonado definitivamente. Até a fundação criada pela administração estadual em nome do poeta está esquecida.

Nesse vaivém de abandono ao monumento, grande parte dos documentos se perdeu no tempo ou está disperso em bibliotecas, para tristeza da família de Bandeira Tribuzi. O filho do poeta, Francisco Tribuzi, diz que muita coisa foi semidestruída pela falta de cuidados e pela ação da umidade e do salitre. E afirma que, ao completar 400 anos de fundação, São Luís deveria ter, no mínimo, um espaço apropriado para expor a obra do poeta. Não um poeta qualquer ou trovador bissexto, mas o poeta de fato e consumado, entranhado na alma da cidade pelo bafo dos seus versos e pelo berro de alforria ao canto parnasiano que pairou sobre a cidade até a chegada de “Alguma existência”.

Sem a memória de Bandeira Tribuzi exposta ao público, o Quarto Centenário de São Luís fica menor. Muito se falou na construção de novos monumentos para a cidade, grandes obras arquitetônicas, instalações luminosas, esculturas de artistas renomados, tudo para marcar o aniversário de quatro séculos. Mas não se lembrou do poeta nem da sua poesia. Talvez alguém inclua “Louvação” num desses ritos oficiais de passagem. Mas a memória de Tribuzi vai se perdendo, tomada pelo capim, abandonada como um sem teto debaixo da ponte que liga a cidade velha à cidade nova. Bandeira Tribuzi fora reduzido a nome de ponte.

Um monumento ao nada


Em 1999, ainda como coordenador das edições de domingo do jornal “O Estado do Maranhão”, sugeri à repórter Selma Cristina Rosa que produzisse uma reportagem especial sobre o estado de abandono do Memorial Bandeira Tribuzi. E mais: que ouvisse especialistas para avaliarem a funcionalidade do prédio - ou para darem a ele alguma real utilidade. A reportagem fora publicada na edição do dia 31 de outubro daquele ano. Selma Rosa ouviu a viúva do poeta, dona Maria Tribuzi, artistas, escritores e urbanistas.

O então presidente da Academia Maranhense de Letras, Jomar Moraes, disse que o espaço criado pelo governo foi uma “lembrança fadada ao insucesso”, em péssima localização. Segundo ele, o memorial ficaria mais apropriado num casarão do Centro Histórico, a ser desapropriado pelo próprio governo. Em lugar do Memorial Bandeira Tribuzi, na Ponta d’Areia, quem sabe um museu náutico, palpitou ele. Ou até mesmo a própria implosão do prédio em franco processo de deterioração.

O arquiteto Ronald Almeida recomendou transferir o espaço para a iniciativa privada. Sugeriu na área bares, restaurantes, loja de esportes náuticos, exposição e comercialização de produtos de pesca. E apresentou um projeto com planta baixa (divulgada na reportagem) que consistia na criação de um complexo turístico incluindo o espaço do Memorial Bandeira Trubuzi, a capelinha em frente ao Iate Clube (o marco zero da avenida dos Holandeses), o antigo Clube 1 de Regatas, o Forte de Santo Antônio (atual base do Corpo de Bombeiros) e um casarão abandonado à época (demolido alguns anos depois), num total de 35 mil metros quadrados.

Restou a dona Maria Tribuzi lamentar o desprezo à obra do poeta. Que salvem pelo menos as duas penas de concreto numa eventual restauração, defendeu ela. “Que cerquem as penas e ponham uma placa alusiva, então”. Quanto ao esqueleto cinza e sombrio do monumento, sem porta ou janela, sem as esquadrias originais de vidro, sem eira nem beira, que fizessem o que bem entendessem. Àquela altura, não importava mais o memorial, sucumbido em meio à vegetação. Mas o local era sagrado. “Ali na Ponta d’Areia ele passava horas pensando e contemplando a cidade antiga”.

ideias e projetos continuam à espera de uma ação do poder público.


Carta (imaginária) a São Luís (*)

Ponta d’Areia, 8 de setembro de 2012


Exausto da solidão ilhéu, já não trago a rebeldia dos cabelos e a carnação azul da barba séria. Já não trago mais. O tempo me consumiu pulmão e coração e mais ainda consome em velocidade a cidade velha. Não sobraram versos, nem a sandália tem sobrado. Daqui os olhos saltam o mar e encontram as paredes puídas e o vestido roto da tua meia morada. Sobre a paz de tua imagem flutuando no Atlântico flui a música do tempo e cresce o musgo dos telhados. Os meus oitenta e cinco anos não são os teus quatrocentos anos, a minha história é bem menor que a tua. Mas nos encontramos pelo menos uma vez por ano na finitude desse chão batido de setembro, aterrado, banhado de sal e sol.

Fui a tua última ponte, o teu anel, mandei o teu parnaso ao beleléu e me entreguei ao ludo real da poesia menina, aveira, sem formulário. Hoje, jubilado sob o cimento sem cor ou vida, entre o céu e o mar estou como um barco vivendo as marés, e a espuma vem dar em meus peitos em dias de ressaca. O arco do sol me refaz esperando o torvelinho dos teus dias. Morro onde o vento se revolta e faz a curva.

No teu novo ano, não venho com um canto de louvação ou um breve memorial pra despistar a minha fadiga. Deixo o louvor aceso no castiçal das igrejas e me visto de padre ou economista para compreender as tuas novas castas. Deixo no primeiro ano do teu quinto centenário o meu marco regulatório, tão em voga nos dias de hoje! De queixa e assombro, afinal sou filho do ruído das palavras.

Em verdade, vai-se acabando o tempo da homenagem, o tempo do reconhecimento. O que permanece é esse sempiterno musgo nos beirais da memória. Se ainda não chegou o final dos tempos em 2012, então chegou o dia do triunfo da folhagem. É esse o marco regulatório que prenuncio. Sem soberba alguma, o memorial que tu me deste era pouco e se acabou. Nada contra o cheiro forte do capim que me cobre a face, mas me sinto vegetal e terra a consubstanciar-se com meus ossos. Vizinho está o mar com sua espuma, com sua raiva e sua ânsia, misturando sua maresia com o acre cheiro do mato.

Do memorial me pego a ver os navios se afastando e uma saudade que não é de amigos nem de parentes subindo aos olhos. É a saudade do futuro que me aflige. Pelos próximos quatrocentos anos deverei ainda dormir à sombra de grandes árvores em noites de espanto, próximas do medo, do frio silêncio, da paz intangível, para depois despertar com o mundo vegetal e as aves roçando meus ombros materiais, sentindo-me pedra. Sim, sinto-me pedra com o barulho das pedras do reggae que ao lado sacodem a minha estrutura de concreto. Acordo um trapo, um trapiche. Desculpe-me se no século passado não tive traquejo para o teu chamego parnasiano. E me perdoe se não levo jeito agora para a tua ginga jamaicana.

Não, não te escrevo para lamuriar. Por todos os caminhos do mundo por onde fui ou ouvi falar, a erva cresce daninha, entre as ruínas de um homem qualquer destroçado. Onde havia poesia, há paredes carcomidas nas quais bichos espreitam sobejos de alguma estrofe.

Diga a Maria que ainda habito um outono enorme. Que um dia quando pó forem meus nervos e minha carne, quando já nada reste dos meus erros, possa ao menos alguém lembrar ao ler o mais triste dos poemas e, lembrando, ouça a música incontida da palavra comigo sepultada: doce, nítida, pura, azul e alada.

Ao povo diga que jamais haverá quem corte o laço que a ti me prende, anel unindo o amante à sua amada, no fatal abraço em que se funde a vida coruscante. E antes que a morte me proíba de renascer as manhãs, deixa-me contemplar mais uma vez essa nesga do teu céu.

Ainda velarei o azul dos teus dias com o que me sobra de esperança. Ainda hei de aprender a tua poesia. Felicidade.

Bandeira Tribuzi
(*) texto baseado livremente em fragmentos de poemas de Tribuzi

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A marca que ficou


Nas comemorações do Quarto Centenário de fundação de São Luís, um dos maiores motivos de orgulho da equipe Clara Comunicação foi a criação do selo comemorativo da data, por encomenda do São Luís Convention & Visitors Bureau e do Comitê Estratégico dos 400 Anos de São Luís.

O selo, criado pelo designer gráfico Jovelino Furtado, foi escolhido em votação popular no final de 2011 e adotado ao longo deste ano por instituições públicas, empresas privadas, produtos, eventos e entidades da sociedade civil.

Juntamente com o selo, a Clara Comunicação também criou o slogan da campanha dos 400 anos: “O melhor da nossa história é a nossa gente”

O desenho do selo traz um gradil colonial ao fundo e fitas estilizadas formando o número 400 nas cores verde, azul e amarelo ouro, presentes na bandeira do município de São Luís.

A marca pode ser facilmente encontrada em vasta papelaria oficial, em fachadas de prédios, nas laterais dos ônibus coletivos, em anúncios publicitários de várias empresas, em brindes diversos, camisetas, uniformes de escolas (estudantes da rede de ensino do Estado desfilaram no Dia da Raça com camiseta estampando o selo da Clara), na latinha do Guaraná Jesus e em medalha comemorativa da Casa da Moeda.

O livro “São Luís 400, um recital de imagens”, os CDs “400 Carnavais” e “A5”, o apoio ao filme “Upaon-Açu, Saint Louis, São Luís...” e a criação do selo oficial são o nosso presente à cidade.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Mais quatrocentos anos

Hoje tem mais dois produtos culturais com a marca da Clara Comunicação nas comemorações do Quarto Centenário de São Luís. A partir das 17h, o Teatro da Cidade (antigo Cine Roxy) será o palco de lançamento do livro “São Luís 400 anos – Um Recital de Imagens”, da Clara Editora em parceria com o Fotoclube Poesia do Olhar. E às 19h, também no Teatro da Cidade, acontece o lançamento do filme “Upaon-Açu, Saint Louis, São Luís...”, um desenho animado produzido e dirigido por Joaquim Haickel, com o apoio da Clara Comunicação, que conta a história de fundação da capital maranhense.

O livro “São Luís 400 anos – Um Recital de Imagens” traz imagens do cotidiano urbano da cidade captadas por fotógrafos profissionais e amadores, a maioria deles empresários, advogados, estudantes e profissionais liberais. São 240 belos cenários identificados por 39 fotógrafos, entre associados e colaboradores do Fotoclube Poesia do Olhar.

Com uma tiragem especial de mil exemplares, o livro traz textos do escritor e juiz federal Ney de Barros Bello Filho e do membro do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, Antonio Norberto. A apresentação do trabalho é de Oton Cardoso Pereira. O projeto gráfico e a diagramação do livro são assinados pelo designer Jovelino Furtado, da equipe da Clara Comunicação.

O filme “Upaon-Açu, Saint Louis, São Luís...”, patrocinado pela Alumar, Ambev e Emap, tem 13 minutos de duração, direção de arte de Beto Nicácio e produção executiva de Ariana Chediak e Nádia Nicácio. A trilha sonora original, mixagem de som e efeitos sonoros são de Yvo Ursini.

Após a exibição de lançamento, cópias do desenho animado em DVD serão distribuídas nas escolas da rede municipal e estadual de ensino e em diversas comunidades da cidade de São Luís.

O filme de Joaquim Haickel sobre a fundação de São Luís foi traduzido para o espanhol e para o francês. A versão de apresentação em português tem narração de Isaac Bardavid, um dos principais dubladores da companhia cinematográfica Herbert Richers. Bardavid participou de telenovelas da Globo como “O Astro”, “Escrava Isaura” e “A Padroeira”. Em 2006 e 2007, interpretou Seu Elias Turco no Sítio do Picapau Amarelo, substituindo José Augusto Branco.