quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

paz sem voz

Tá tudo tão estranho lá fora.

É melhor armar a cama na varanda.

Ou quem sabe preparar a cadeira de balanço para o futuro.





terça-feira, 18 de janeiro de 2011

O melhor o tempo esconde


Já não se leva a vida no laço quando se chega aos 30 anos. A idade é um passo. É na curva dos 30 que se perde a rédea da distração, do sarro, da maresia. Aos 15, aos 20, aos 25 anos, qualquer emoção é um bom pretexto para driblar o destino, vagarosamente. Ali se faz a verdadeira tempestade em copo d’água. É só depois dos 30 que se ouve falar de apólice, coca light, ômega 3, imposto de renda, ração humana. Depois que se ultrapassa a barreira dos 30 o cinema é quase um albergue.

Não venha me dizer que alguém é sério aos 18 anos, que é maníaco depressivo aos 21 e que parou de beber e virou evangélico aos 23! Depois dos 30 todos querem voltar aos 20 anos. O espelho, porém, começa a fazer troça e não adoça mais o gosto da cereja. O medo dos 40? O peso dos 30 é igualmente doloroso!

Passa o tempo, passa a vida, o passo encurta e o ombro emite o primeiro sinal de parábola. A vida é meio serenidade, meio compromisso na idade decantada na literatura para compor o flamejante universo feminino. É na faixa dos 30 que o americano começa a sonhar acordado com a ideia fixa do primeiro milhão. Triste daqueles que nem chegaram aos 30. Não puderam experimentar a sensação da responsabilidade, da conta no final do mês. Não puderam ler jornal e nem batizar o filho do casal vizinho. Não foram ao supermercado sábado pela manhã. Nem ouviram música clássica. Não sabem de cor o capítulo da novela. Não beberam vinho no silêncio da noite mal dormida e nunca compreenderam exatamente qual o sentido da vida. E quem haverá de compreender?

Depois dos 30 a contagem é regressiva. A memória, uma armadilha: insiste em remexer com voracidade no baú das velhas músicas da década passada e no álbum de retratos dos acampamentos, das viagens de última hora, do beijo pela metade e de outras tantas carradas de paixão. Viva a máquina digital. No cristal líquido a imagem não amarela!

Aos 30 submergimos naquilo que se convencionou chamar de o primeiro ano do resto de nossas vidas. E, afinal, por que a vida desacelera quando mais se pretende decifrá-la em movimento? Só depois dos 30 é que se olha para trás. Todo mundo quer casa, filhos, comida e roupa com cheiro de lavanda. Depois dos 30 bate aquele medo da solidão, do caritó, da exceção do amor. Bate o medo da vida breve. Daí a ração, o ômega e o seguro. Daí os acasalamentos, as ressonâncias magnéticas, o guarda-chuva, o pára-quedas, a neosaldina. Metade Prozac, metade Balzac.

A propósito, já passei dos 40. Mas o retrovisor é qualquer coisa parecida com uma usina de reciclagem do tempo.

(foto: Meireles Jr.)