sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Quando a poesia é música clássica e popular

Jorge Abreu



Do título ao último poema, o livro Filarmônica para fones de ouvido, de Félix Alberto Lima, é instigante e encantador. Em tempos de extremismo em todas as esferas, e do que costumo chamar de imbecilidade generalizada que assola o planeta, Félix Alberto nos dá lições de como a simplicidade é, realmente, o último grau da sofisticação, como muito bem a definiu o gênio Leonardo da Vinci. Uma simplicidade que só se consegue através de muito trabalho, de acordo com a sempre profunda e visceral Clarice Lispector.

Na sinfonia clássica e mais que contemporânea e popular da filarmônica de Félix Alberto Lima temos a dor da solidão do provável suicida (“Uma noite longa”, pag. 30), e a confissão do contentamento do autor, que se nega ao poema raivoso, mesmo sendo ele, hoje em dia, bem mais elegante (“Destempo”, pag. 43).

Como o título sugere, é um livro musical, esse do Félix Alberto. Que vai do mais puro rock and roll (“Back up”, pag. 47) à “Cantiga de roda”, título do curto e ousado poema da página 44. Ao longo da sua leitura, confesso que me senti como se ouvisse de Bach a Beethoven, passando por Rolling Stones e Zeca Baleiro.

Mas, sem spoiler dos poemas, eu digo que Filarmônica para fones de ouvido vai mais além: nele tem lembranças de infância e juventude que remetem à poética dos inevitáveis Ferreira Gullar e Nauro Machado; e à grandiosidade de Aluísio de Azevedo e José Chagas (“Cartografia dos mares de dentro”, “Resinas resignadas”, “Insulano” e “Ribamares”).

Impossível não lembrar de Antônio Carlos Jobim e Machado de Assis ao ler/ouvir a potente e delicada Filarmónica de Félix Alberto Lima. Imprescindível ressaltar que o livro tem uma pegada de crônica de costumes que considero sensacional (“A mesa quando vai ser posta”, pag. 33; e “Ânsia de um homem comum”, pag. 37, para ficar em apenas dois poemas).

É um livro para ser lido de uma vez só, esse do Félix Alberto Lima. De preferência no silêncio de uma madrugada pós noite de chuva, como eu o fiz. Foi assim que mergulhei na identidade do poeta, no cerne da sua escrita, que me levou de Barra do Corda a São Luís do Maranhão, do Rio de Janeiro a Nova York, embriagado pela poesia de um autor em sua plenitude. Um poeta consciente de que a poesia é para provocar. É para gerar sentimentos e emoções. Fazer o leitor pensar e viajar. Eu senti, e fiz tudo isso, meu caro Félix Alberto Lima. E tenho mais é que dizer: muito obrigado, poeta! Todos os meus aplausos à tua Filarmônica para fones de ouvido!

[Jorge Abreu, 15 de janeiro de 2019]