sexta-feira, 5 de novembro de 2010
Mil palavras
Boas imagens são caras porque são raras. Marcam, impregnam, identificam, decodificam, inspiram, emocionam, chocam, arrebatam, provocam reações imprevisíveis. Certas imagens são como música: incendeiam a memória, despertam a paisagem adormecida na lembrança e fazem passeios fugazes pelos arredores da alma.
A fotografia tem desses truques! Revela o novelo do rápido instante, subverte o real, recorta a cena e surpreende o artesão do clique. O truque da fotografia é uma arte sem trinco. Obturador aberto. Não pega no tranco, pois há técnica na arte de quem trata e retrata a imagem, no lambe-lambe chinfrim, no estúdio sofisticado. Há no ofício dos fotógrafos o contraste de cores que ninguém faz, a luz que poucos enxergam, o detalhe que não se alcança a olho nu, o enquadramento.
Boas imagens são caras. O fotógrafo não vende um pedaço de papel estampado. Ele vende o olhar. Olhar de fotógrafo não tem tabela de preço. Não existe atualização monetária para o olhar. Certas imagens são definitivas. Fotografias não são máquinas, mas observações raras. Não é a Nikon que faz a diferença. É a intrepidez de quem manuseia a lente. Pode ser Canon, Polaroid, Love ou Xereta.
Elas estão nos jornais, nas revistas, nos pôsteres, nos postais, nas gavetas, nos outdoors, no porta-retrato, no computador e no imaginário. Há fotos que são uma outra linhagem da poesia, que saltam do papel feito um soneto, que não largam o cais da retina porque estão ancoradas em redondilhas. E quando elas falam? As fotos têm as suas verdades recitadas. As fotos têm essas manias.
Há quem não perceba o movimento que é peculiar em algumas fotografias. Fotos que dançam um balé quase perfeito, que desfilam imponentes pelos álbuns de recordação, que se remexem de tão vivas que estão no fosco do papel couchê. As fotos não param.
Fotografias relembram datas, pessoas, lugares e coisas. As fotos digitais desafiam o tempo com a evolução quilométrica de seus pixels. Já as imagens em preto e branco nos remetem ao passado. Fotos amareladas com cheiro de mofo refletem o passado em sépia dos nossos avós na parede. A fotografia, depois de remexida nas gavetas, faz pactos de convivência amistosa com a saudade.
As boas imagens não têm preço na praça. Não disputam mercado, não estão nas prateleiras do comércio. O olhar do fotógrafo está à espreita, sem sossego ou cerimônia. Afinal, ele não se contenta. O fotógrafo é um artista plástico que pinta a sua tela com uma câmera apoiada na mão e o olhar captando o infinito cotidiano.
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