terça-feira, 15 de outubro de 2013
A outra trilha de Betto Pereira
Betto Pereira tem um bom pedaço da vida dedicado à música. Já se vão mais de 35 anos de palco, desde o primeiro contato com o cavaquinho em encontros boêmios com os amigos, no final dos anos 1970, até a gravação do seu último disco, o CD “Samba que é bom”. E como uma arte puxa a outra, a música o aproximou do teatro no acabamento de trilhas sonoras nas peças encenadas por Aldo Leite.
Mas foi durante a formatação de “Samba que é bom”, no segundo semestre de 2012, que Betto Pereira desaguou de vez na pintura. Desde muito cedo ele já ensaiava os passos iniciais com o pincel e chegara a presentear amigos com pinturas quando ainda morava em São Paulo na casa do amigo Chico Saldanha. Seguiu pintando algumas pequenas telas, mas sempre de maneira tímida e para consumo meramente doméstico, como se tomado pelo medo das cores ou do movimento das mãos e da combinação de tons. Era o artista plástico ensimesmado em plena rebelião do casulo.
Um dia decidiu ousar na primeira tela, e depois na segunda, na terceira... Experimentou cores e se deixou levar pelo traço errante, novo, menos figurativo e mais lúdico. Quando se deu conta, já havia criado toda a cena de botequim de “Samba que é bom”, material utilizado na arte gráfica do disco.
Dos botequins, Betto partiu para as bicicletas multicoloridas, que ganharam forma e movimento e tomaram as ruas de São Luís do Maranhão, a sua cidade cantada. A música, parceira inescapável, transformou-se em presença quase obrigatória com os seus instrumentos e personagens bailando no acrílico sobre tela. A pintura cresceu, as telas multiplicaram-se no tamanho e na inventividade.
“Telas & tons”, esse conjunto expressivo de cores com o qual Betto Pereira debuta nas artes plásticas, representa a leitura de cenas que de alguma forma identificam-se com o universo onírico do menino aprendiz, autodidata e de forte personalidade, como a máquina fotográfica, o disco de vinil, a radiola de reggae, os pregoeiros, os barcos que singram a baía de São Marcos, o bumba-meu-boi, o pandeirão, o cazumbá, a gafieira, os papagaios de papel.
A essência da pintura de Betto Pereira está no movimento. Mas não é um movimento qualquer, abusado ou fora de contexto. Não é a velocidade da urbe, mas o movimento forjado na leveza que a vida nos cobra numa tarde de sábado, por exemplo. Quanto mais refestelado nas tradições, na cultura popular da sua aldeia, mais moderno Betto Pereira se espicha no traço. A coleção “Telas & tons”, assim como as tardes de sábado, é um convite ao contentamento.
(A exposição “Telas & tons” acontece nesta quarta-feira, dia 15 de outubro, às 19h, no Shopping da Ilha, com pocket show do disco “Samba que é bom”)
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