quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Aonde você vai passar o fim do mundo?


Pensei em ficar em casa acompanhando o noticiário pela CNN, os primeiros destroços nos lugares mais ermos mostrados em tempo real, repórteres enlouquecidos em busca de testemunhas, o comércio fechando as portas. Imaginei sair perambulando pelas ruas em busca de sobreviventes, melhor não, diz o vizinho, ninguém sabe o que pode acontecer, o mundo anda muito agitado. Cogitei arrumar a mochila, algum lugar que não tenha vento forte ou mar, viagem rápida de avião. Mas aí lembrei dos aeroportos lotados, longas filas de embarque e dos capítulos iniciais de Lost.

Uma arca com GPS seria uma mão na roda na travessia, fauna sincera, dragões de fé e um pouco de silêncio na hora da novela, São Jorge à espreita. Jamais recorreria à alma fraca dos Maias de Eça de Queiroz para saber o que tanto querem os maias mesoamericanos nesse final de mundo de amanhã. É fatal mesmo como dizem ou ainda dá pra tirar o nome da lista? Haverá uma primeira leva, uma segunda e terceira? Ou todo mundo vai junto sem sorteio algum, tipo ordem alfabética?

Fui ler com cuidado a profecia e lá está bem claro que o mundo não acaba no início do dia 21, mas ao final dele, já encostando no dia 22, ou seja, temos aí mais algumas horas pra buscar uma saída honrosa. A virada mesmo, aquela tipo réveillon, é de sexta pra sábado e não de quinta pra sexta como a imprensa insiste em nos convidar. E olha que os maias nos apontam dois caminhos: ou sumir do mapa, evaporar, desaparecer de vez e nunca mais pôr os pés no planeta; ou evoluir na consciência de que somos parte do todo, aquele todo mesmo, e que podemos existir em uma era de luz. Entendeu?

Eu sei, é confuso e faltam poucas horas. Parece que o problema todo tá no deslocamento do eixo de rotação da Terra. É uma coisa meio diferente, acho que o último teste foi no dilúvio, só que agora tem a ver com mancha solar e a temperatura cada vez mais alta de Teresina. Para os maias, o nosso desafio de amanhã é atravessar o portão do medo, claro que passando antes pelo salão de espelhos, olho no olho com a nossa alma, o confessionário do último dia, muita gente aguardando uma resposta. Veja que com uma responsabilidade dessa pela frente e o Senado interessado no destino dos royalties do pré-sal. Pode? Segundo os maias, o fim do mundo nada mais é do que o veto à vida. Essas coisas de punição que os parlamentares não engolem. Não evolui, não produz, não consegue existir numa era iluminada, alguém vai acabar vetando algo maior, a existência, a matéria, sabe lá.

O sexto ciclo solar, de acordo com a profecia maia, começa no sábado e não tem hora pra acabar. Como assim, o mundo então vai ter uma segunda chamada, uma prova de recuperação, uma repescagem? O risco, meu caro, é o portão do medo que dá acesso livre à sala de espelhos. E não é assim em grupo, todo mundo de uma vez furando fila. O teste é individual com questões discursivas sobre autoconhecimento, vida pregressa no condomínio, frequência vibratória elevada, a respiração da galáxia, o “tempo-do-não-tempo” e outras coisas que você só encontra no Google mesmo.

Lenda ou não, o mundo de alguma forma vai sofrer um abalo amanhã. E não é por falta de aviso. O calendário maia há muito pede uma providência, clama por uma mudança de atitude. O que os mais birrentos ainda não entenderam é que a cura do planeta depende de uma consciência coletiva. O dia fora do tempo está dentro de cada um. O juízo final, como o próprio nome diz, é a última instância, tipo o voto do Joaquim Barbosa. Não há mais como recorrer.

Aonde passar, afinal, o dia de amanhã? Em casa, no porão, no clube, no meio da rua? Quem sabe na praia de Copacabana... Talvez não, os fogos de artifício podem parecer o primeiro sinal, e aí o tumulto se forma, ninguém se concentra e o fim do mundo acaba acontecendo antes da hora marcada. Na dúvida, ando lendo “1.000 lugares para conhecer antes de morrer”, de Patricia Schultz (Editora Sextante), em busca de alguma dica. Das 729 páginas, nem cheguei à metade. Passeei pelo Saara marroquino, subi o Himalaia, tomei chá em Machu Picchu, me hospedei num hotel de gelo na Suécia e avistei as ruínas maias de Palenque, no México. Por enquanto só pistas falsas. Mas acho que vou até o fim. E com que roupa?

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